sábado, 29 de dezembro de 2018

DIÁRIO DE VIAGEM DE UM RECENSEADOR DO IBGE

Esse texto relata o meu dia a dia como recenceador do IBGE, durante dez dias que passei pelos rios realizando o censo agropecuário.

Desculpe-me pelos erros ortográficos ou de concordância no texto, é que eu não sou um professor de língua portuguesa (rsrsrs)...

Distância de onde eu saí, dá cidade de Afuá até o meu setor, na regional do baiano. Parece perto, mas não é!


Segunda-feira, 18 de dezembro de 2017, 11h da manhã.
Partimos do rio cajuúna a bordo do barco sempre com Deus, para o setor 019 (é assim que o IBGE chama os lugares no censo) lá pras bandas do rio baiano. Me ponho sobre a janela para olhar a cidade, avisto meu irmão na porta da minha casa e dou um tchauzinho. Também avisto os supervisores e o ACM do IBGE lá na secretaria de agricultura e pesca, que também acenam para mim.

Me programei para uma viagem de dez dias. Levei mantimentos, remédios...E muita fé de que tudo ia dar certo e eu ia voltar bem para casa. Como sempre (essa era a minha terceira viagem) paramos em um posto flutuante e abastecemos com óleo diesel suficiente para os dez dias.

Barco "sempre com Deus", que nos levou para essa viagem inesquecível.

Começamos a atravessar a baía do Vieira grande por debaixo de uma leve chuva, nada que nos preocupasse...Mas de repente o tempo fecha! O céu escurece, uma chuva muito forte nos atinge e somos obrigados a fechar todas as janelas do barco, algo muito chato para mim que gosto de ir olhando as paisagens.

Os ventos fracos são instantaneamente substituídos por ventos muito fortes, as ondas aumentam de tamanho, o barco balança cada vez mais, meu medo de vomitar dispara...o vento frio entrando pela porta e batendo no meu rosto só deixa a situação mais tensa. Logo, já não se avista mais a mata lá ao longe, só se vê céu e água...O medo consome o barqueiro (Rsrsrs)...Ele, experiente, com mais de treze anos de viagens, já não sabia mais para que direção ir, pois só se via o branco da água e o cinza do céu. Ele para o barco e pensa em voltar. "Não posso arriscar a nossa vida com esse tempo", disse ele com voz tensa.

O tempo fechou na baía do Vieira grande!

Chuva chegando e cobrindo a mata, a baía...

Neste exato momento a chuva começa a passar e a mata começa a aparecer. Em meio a uma chuva passageira ele continua a viagem rumo a margem.
A chuva passa, mas os ventos não!
As ondas só aumentam de tamanho, calculo em quase dois metros de altura, nunca vi ondas tão grandes, de repente começa a me dar um enjoo do caramba...Eu começo a pedir para forças divinas fazer parar essas ondas e esse enjoo...Não sei se foi por causa do meu pedido (Rsrsrs), mas os ventos diminuíram e consequentemente as ondas e meu enjoo também.

Tudo que é bom dura pouco!

Lá vem de novo a droga da chuva.
Se passam duas horas de muita chuva, vento forte e muito enjoo.
Não estava mais aguentando essa droga de enjoo, até que me ajeitei num cantinho do barco, me sentei pra ver se eu dormia um pouco, minha vontade era acordar só quando estivesse longe da baía...Foi quase isso que aconteceu, eu dormi sentado, acordei dolorido e já tínhamos chegado na margem da baía e as ondas diminuíram bastante e meu enjoo também. Era por volta das quatro da tarde, deitei na minha rede e dormi. Acordei já era quase seis horas da noite já num rio calmo. Mesmo após sete horas de viagem, ainda não era o destino final. Paramos em uma vila para pernoitar.

No dia seguinte, as sete horas da manhã partimos rumo ao meu setor, regional do baiano. Depois de quase duas horas de viagem e quase nove horas num total enfim chegamos em uma vila. Ao chegar no rio baiano a gripe já tinha chegado com tudo em mim, meu nariz vivia escorrendo, eu gastei quase um rolo de papel higiênico durante a viagem para limpar ele (kkk)...essa vila tinha mais de 10 casas.

Após entrar em uma casa não conseguia nem respirar direito, pois meu nariz estava entupido, nesse momento cai uma forte chuva (de novo) fico sentado no sofá da casa conversando com a moradora até a chuva passar. Eu já ia indo embora quando muito generosamente ela me ofereceu um remédio para gripe, eu aceitei e fiquei feliz com aquele gesto. Fico impressionado com a quantidade de sedes (casa de shows) nesta localidade, cada uma com um nome interessante como arena três irmãos, balada show, arena verde, etc. Por volta das 3 horas da tarde chego no rio portel e me deparo com uma vila enorme com mais de 20 casas. Começo o recenseamento três da tarde e termino 7 horas da noite, nessa vila acabo encontrando um parente meu.

Por esta vila comecei o recenseamento.

19 de dezembro, sete horas da manhã, acabei de acordar. Estou deitado na minha rede da cor do exército escrevendo isso. O amanhecer na zona rural é lindo! É uma terapia para qualquer pessoa estressada. O ventinho frio no rosto, o barulho do vento nas árvores, o canto dos pássaros, papagaios, araras, o piado dos pintinhos, o barulho dos patos, o roncar dos porcos pelo terreiro ou chiqueiro...(porco ronca?)...

20 de dezembro, chego por volta das 10:30 da manhã num rio chamado duas bocas 1, um rio estreito e enorme de comprimento, a primeira vista parece ter poucas casas...Paro em um estabelecimento agropecuário (porque é assim que o IBGE chama as residências nesse censo) e após uma conversa descubro que neste rio há cerca de 30 casas. Logo eu coloco na minha cabeça e na do barqueiro também "a gente tem que terminar de visitar todas elas hoje!" Deu 1h da tarde, eu já estava preocupado, pois a minha bateria extra havia descarregado, meu celular estava quase descarregando e eu nem havia mandado notícias para a minha família de que eu havia chegado bem no meu setor. E a bateria do meu DMC (dispositivo móvel de coleta, tipo um celular onde anotamos as respostas do entrevistado) também já estava em 58%, eu sabia que isso era pouco para visitar todas as outras 23 casas que faltava e eu já estava morto de fome (kkk). Parei pra almoçar. No meio do almoço cai uma chuva com ventos muito fortes. Temos que correr para fechar todas as janelas do barco.

Rio duas bocas 1. É enorme de comprimento.

Minha preocupação continuava, como vou carregar meu DMC e minha bateria extra se só tenho um carregador!?
Mas eis que eu descubro que na casa cujo porto o nosso barco estava atracado tem energia solar! Que maravilha! Pedi permissão para carregar minha bateria extra. Era 3h da tarde, e disse para o dono da casa"vou visitar as outras casas e depois eu volto para buscar".

Continuo a viagem pelo rio duas bocas 1, dá 5h da tarde e ainda falta umas 12 casas para visitar e em cada casa eu gasto uns 15 minutos fazendo as perguntas e o barco era meio lento e as distâncias entre uma casa e outra eram grandes. Fico mais preocupado ainda quando vejo que a bateria do meu DMC estava em 29% não sabia se ia dar.
Mas eis que eu visito a casa de um cara muito gente boa, eu reclamo para ele que ainda falta bastante casas para visitar e que achava que não ia dar tempo, pois eu queria terminar naquele dia! Muito generoso, ele se oferece para me levar de rabeta no restante das casas, que é quatro vezes mais rápido do que os barcos. Meus olhos chegaram a brilhar (Rsrsrs)...Eu lógico que aceitei. Visitamos todas as casas. Já era sete da noite quando acabamos. Se fosse no barco terminaríamos umas 9h.

Ele me levou de volta ao barco e eu pensei "égua, o cara foi muito generoso comigo, tenho que pagar ele", foi isso que eu fiz. Só tinha R$ 20 e dei pra ele. Me surpreendi quando ele disse "é muito, só quero R$ 10"... É realmente ainda existem pessoas boas e generosas nesse mundo.

Rio duas bocas 1. Um lugar muito bonito. 


Por volta das seis e meia da noite o silêncio dos rios e interrompido pelo barulho dos motores que são ligados para gerar energia. Quase 100% das casas tem um e a maioria dos moradores só liga a noite para clarear na hora do jantar e para assistir as novelas ou telejornais. Por aqui a placa solar já está ganhando espaço e a internet também.

A noite aqui é linda, principalmente quando tem poucas nuvens no céu. As estrelas parecem que vão cair sobre minha cabeça...São tantas, o reflexo delas na água deixa a noite ainda mais brilhante.

Sexta-feira, 22 de dezembro, cinco dias sem comunicação com minha família. Tenho certeza de que eles estão preocupados com essa falta de notícias minha. Nas outras viagens eu geralmente mandava uma mensagem em no máximo três dias, dizendo que estou bem. Mas eis que eu chego em uma residência perto de uma escola que tem antena rural, a dona da casa deixou eu usar ele aí eu mandei uma mensagem para minha irmã dizendo que estou bem.

Eu em algum lugar do meu setor.

Sábado, 10h30min da manhã. Entramos no rio Ipaneminha, um dos afluentes do furo grande. Assim que o barco encosta no trapiche sou recepcionado por um pequeno cachorro, pequeno porem muito bravo! Assim que ponho os pés na rampa ele avança em minha direção...E dá-lhe várias mordidas em minha "perna", na verdade ele estava mordendo a calça e não fazia nem cóssegas (Kkkk). Conforme subia a rampa, o animalzinho não desgrudava da minha perna ele estava muito revoltado com a minha presença, ficava tentando subir na minha perna e não parava de morder. Eis que aparece o dono e da um tapa nele (Kkkk...Eu gostei, mas fiquei com pena tadinho). Durante a entrevista aparece um porco de estimação de 30cm de comprimento e também resolve me morder (Kkkk)... Doí bastante, o dono pegou ele pelo rabo e o jogou no chão.

Nosso povo ribeirinho é muito hospitaleiro, antes mesmo da embarcação encostar na rampa ou trapiche percebo que eles já estão preparando uma cadeira para eu sentar. Durante a entrevista geralmente me serviam um café...na outra casa mais uma xícara de café, na próxima mais outra... Eu nunca tomei tanto café em toda minha vida (Rsrsrs) às vezes eu recusava com educação, pois meu estômago não estava mais aguentando tanto café (Kkkk).

Natal na zona rural


Quem disse que na zona rural as pessoas não entra em clima de Natal? Em várias casas vejo pisca pisca, árvore de natal, guirlandas nas portas entre outros enfeites natalinos.

Domingo 24 de dezembro, véspera de Natal. Já acordo com uma música lá longe...é da banda 007 "Dona Maria deixa eu namorar com sua filha, vai me desculpando a ousadia"...ouço tanto essa música por aqui que já até decorei a letra (Rsrsrs).

Fim da manhã da véspera de Natal, termino ou recenseamento nas casas do rio ipaneminha. Os ribeirinhos estão se preparando para o Natal. Já estão abatendo o porco, a panela já está no fogo, já estão colhendo as frutas e verduras na roça...A movimentação no rio é intensa. No bar já estão preparando o som, comprando os vinhos...No fim da tarde, os convidados chegam, os catraios vem lotados.

Viajamos agora rumo ao rio Ipanema, muito maior em largura e comprimento. O rio Ipanema fica nas margens da baía, faz fronteira com o Amapá. De onde estou dá até para enxergar a capital Macapá lá ao longe. Conforme avanço rumo a este rio vejo o assoreamento da terra nas margens, coisa normal por aqui, a terra está caindo e leva junto as árvores e até as casas. De onde estou dá até para ver a ilha Rasa e a ilha do Pará.

Noite do dia 24 de dezembro, após sermos expulsos de um trapiche por um morador bêbado que estava com um litrão de 51 dentro do casco, fomos em busca de um porto seguro para dormir. Durante a madrugada inteira, o vai e vem de pessoas bêbadas no catraio pelo rio foi constante.

Manhã de Natal no rio Ipanema. Acordo em meio a um frio do caramba, fora do normal, nunca tinha sentido um frio tão grande, parecia que meu lençol e minhas roupas estavam molhados acredito que devia estar fazendo uns 20 graus, era por volta das 6 horas da manhã. Como é Natal nos levantamos um pouco tarde 9 horas da manhã. O frio ainda continuava mesmo com sol o aparecendo...o povo estava com ressaca, eu acho que quase todas as casas continuavam fechadas, no decorrer do caminho encontro pessoas bêbadas pilotando suas rabetas, pessoas fazendo churrasco e tomando uma cervejinha nas suas casas.

Entrevistei pessoas que estavam um pouco bêbadas (Rsrsrs) muitas vezes eu chegava na hora do churrasco e interrompia a comemoração de natal deles (Rsrsrs). As casas estavam lotadas de amigos e parentes que vieram de Macapá passar o Natal com seus conterrâneos.

Como nem tudo são flores, tem situações um pouco chatas no meio do percurso, que vou enumerá-las por ordem de importância:

1- insegurança

É o que mais nos preocupou desde o início da viagem, pois haviam rios em que o barqueiro nunca havia entrado. Para dormirmos tranquilos, tínhamos que procurar um porto confiável, de gente do bem. Os moradores me contaram que a violência aumentou muito nos interiores. Dias antes de eu chegar por lá aconteceu vários assaltos e assassinato de um morador. Os piratas amedrontam os moradores. Eu fiquei bem assustado com isso .

Um dos portos em que nós pernoitamos, no rio Ipanema.


Conforme avançamos pela baía na divisa com o Amapá entramos em igarapés cada vez mais perigosos, uma moradora nos alertou que um certo morador não queria que eu visitasse a casa dele pois ele temia que eu "fosse tomar o terreno dele", algumas pessoas pensavam que eu era policial, por causa do colete do IBGE.

2- As praias

Tá aí outra coisa que me deu muita dor de cabeça, às vezes entrávamos em rios que tinha praias de lama enormes, para eu chegar até a residência tinha que tirar o tênis, enrolar a barra da calça e pular na água e ir caminhando até a rabeta cheia de água da chuva, onde eu lavava meus pés, então que eu subia na rampa e entrava nas casas.

3- Os cachorros

Às vezes eu chegava nas casas e quem me recepcionavam eram os cachorros. Às vezes vinha de quatro para cima de mim, às vezes vinha apenas um...mas era um pitbull (Rsrsrs) eu lógico que ficava no barco até aparecer o dono da casa e eu adentrar em segurança. Só que às vezes mesmo com todo o barulho dos latidos dos cachorros ninguém aparecia e eu batia palma, batia palma...
Entro numa casa e após terminar entrevista sou alertado pelo morador "cuidado com o guerreiro"...Fiquei sem entender, depois vi que era um cachorro enorme, esse nome é por causa do jogador do Flamengo (coitado do cachorro kkkk).

6- Calor

Eu sempre vestindo calça preta, tênis e por cima da camisa o colete do IBGE e mais o boné do IBGE (que são de uso obrigatório) sempre me sentia dentro de um forno tipo uma cebola com várias camadas debaixo de um sol escaldante. O alívio vinha quando chovia, pois o clima ficava menos quente, mas também a chuva atrapalhava um pouco o trabalho de campo, pois eu não tinha guarda-chuva, tinha que esperar ela passar.

26 de dezembro 7h da manhã. Após recensear todas as casas do rio Ipanema partimos rumo ao igarapé "espera". Estou deitado na minha rede escrevendo isso, "embrulhado" com meu lençol Azul, está muito frio, deve está uns 20 graus. Aqui na zona rural as temperaturas são mais baixas do que o normal de manhã cedo. Recenseamos todas os estabelecimentos agropecuários do referido Igarapé, já era por volta das 11 horas da manhã quando concluí meu setor. Nosso pensamento era voltar para pernoitar no rio baiano, mas estava longe e a maré estava contra e resolvemos então seguir em frente a favor da maré, vamos fazer a roda pela região conhecida como porcos. Pensamos em ir pela baia, mas resolvemos cortar caminho pelo "furo do Tartaruga", um rio muito calmo, sem maresia e com muitos barrancos de lama e muito assoreamento nas margens.

Assoreamento nas margens dos rios. A terra está caindo, por causa da forca da maré.


Já é mais de meio-dia, a fome aperta vou fazer o almoço, um "engasga gato" com açaí de 9 dias. Quando estou preparando o almoço vejo o branco de uma chuvarada se aproximando...e ela chega com tudo! Égua, o vento foi tão forte que "assobiava" no rio calmo. De repente, se formou ondas de um metro de altura e eu parei de cortar as cebolas e abri um pouco a janela e olhei o vendaval. O vento foi tão forte que o barco não andava para frente, eu fiquei muito impressionado nunca vi uma tempestade tão violenta se formar em tão pouco tempo, até o barqueiro com mais de 13 anos de experiência ficou assustado, era maresia para todo lado, como eu gosto de fenômenos da natureza achei aquilo lindo! Tão rápido ela veio, tão rápido ela se foi! Ela passou, não durou nem 10 minutos.

Depois de 4 horas de viagem chegamos por volta das 16:30 no igarapé Furtado, na regional da Serraria Pequena onde iríamos pernoitar. O dono da residência nos dá um litro de açaí, um dos melhores açaí que já tomei, só a papa, açaí batido na hora direto do pasto, com gosto e cheiro de açaí de verdade.

A noite antes de dormir sempre batiamos um papo, conversávamos sobre tudo família, mulheres, Deus, contávamos piada, já estávamos nos preparando para voltar para casa no dia seguinte.

No decorrer do percurso do meu setor encontrei muitas paisagens bonitas, encontrei sítios tão bonitos com pastos limpos, flores e frutas de todas as cores, espécies, parecia o paraíso. Uma coisa que chamou minha atenção foi a altura da terra (Rsrsrs) que é bastante alta por aqui.

 Lugar bonito.


Durante todo o tempo que passamos por aqui o radio era nosso grande companheiro, ele dava uma animada quando estávamos tristes, com saudades da família. As rádios de Macapá são muito interessantes, têm programas para todos os gostos. Ao acordar, a gente sempre escutava o programa acorda Amapá. Na hora do almoço a gente sempre escutava o programa alô, alô Amazônia. Às 5 horas da tarde, quando não estávamos recenseando os estabelecimentos, escutávamos o programa humorístico "os cabuçús", a noite o programa romântico "música pela janela" e assim os dias iam passando.

As casas aqui são tão bonitas quanto as da cidade.
Percebo que na zona rural há muitas igrejas católicas e evangélicas. Há igrejas muito bonitas esteticamente. Todos os rios e Igarapés por onde passei que tinha no mínimo dez famílias morando, tinha pelo menos uma escola, só estavam fechadas por que os alunos já estavam de férias. Agora com relação a postos de saúde..."nunca nem vi" (Rsrsrs).

Percebo que aqui o povo é mais amapaense do que paraense devido à proximidade com esse estado, as trocas comerciais também são intensas. Daqui para Afuá são 7 horas de viagem, daqui para Macapá é uma hora e meia... quanto diferença.

Após recensear um estabelecimento, paro para fotografar a paisagem.

Durante o percurso do meu setor levei vários tombos e escapei de quedas mais sérias. Às vezes as rampas para subir eram muito inclinadas e a sola do meu tênis era meio escorregadia. E quase sempre escorregava mas eu me segurava e não caia para a água, às vezes caía e molhava todo o meu tênis. É...a vida de recenseador do IBGE não é fácil! Às vezes eu pensava "mas o que eu tô fazendo aqui? quero ir embora" pensava em desistir, mas eu também pensava "não! Eu estudei 3 meses, 5 horas por dia para passar nesse processo seletivo, para desistir agora? e resolvi seguir em frente com a cabeça erguida, mais forte do que nunca (Rsrsrs).

27 de Dezembro, quarta-feira, 6 horas da manhã. Partimos de volta para casa. Continuo deitado com muito frio (kkkk), minutos depois o sol aparece entre as nuvens e começa a esquentar o clima. Para minha surpresa a baía do Vieira grande estava tranquila, dava até para ir deitado na rede já que ela não ficava balançando por causa das ondas. A gripe já foi embora há 3 dias, a sensação de voltar para casa é muito boa, me sinto renovado. Em pé, escorado na janela e olhando a paisagem, vou relembrando tudo que já passei nesses 10 dias. A hospitalidade do povo, as brincadeiras, as risadas as  lindas paisagens que vi, a sensação de insegurança...tudo volta em minha mente.

Na volta pra casa, teve um lindo nascer do sol.

Oh viagem boa, sem maresia.


Às vezes o Barqueiro me olha com curiosidade tentando adivinhar o que eu tanto escrevo nesse caderno...vai continuar sem saber (Kkkk).
Percebo que uma Gaivota está atravessando a baía também junto com a gente...só que ela não quer pousar no barco para descansar as asas, então OK se ela prefere ir voando o problema é dela (kkkk).

Atravessamos a baia, entramos no rio Piraioara, a chegada está cada vez mais perto, começo a arrumar as minhas coisas desmancho minha rede da corda, guardo minhas coisas na mala e na sacola,  enfim só resta esperar. Logo vejo a cidade das bicicletas, a minha Veneza Marajoara, já estava com saudade desse vai e vem das bikes pois nos últimos dez dias vi diariamente o vai e vem dos barcos, catraios, cascos...A igreja matriz e o hotel Dias chamam a atenção de quem está chegando, são as construções mais altas da cidade.

Chegando em Afuá.


Às 11:10 da manhã após 4 horas de viagem o barco atraca de volta de onde havia saído há 10 dias. Por debaixo de um chuvisco de chuva e um forte sol ao mesmo tempo, desembarco. Agora já estou em casa escrevendo o final deste diário de bordo, após contar um pouco do que passei nesses 10 dias para minha família é hora de pegar o celular e dá uma olhada nas redes sociais porque não sou de ferro (Rsrsrs) e por aqui encerro, obrigado a você que leu até o fim.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Paraense é premiado em concurso de fotografia do IBGE

Josivaldo Ribeiro (centro) ao lado do diretor do censo agropecuário do IBGE, Antônio florido (direita) e Regivaldo Aguiar, analista de geoprocessamento do IBGE Pará (esquerda).

O paraense Josivaldo Barbosa Ribeiro, 23 anos, vencedor do Prêmio Fotográfico Censo Agro 2017 na categoria Cenários Urbanos esteve no Rio de Janeiro (RJ), no dia 12 de dezembro, para receber seu prêmio de R$ 5 mil. O concurso premiou três categorias, Cenários Rurais, Atividades Agropecuárias e Cenários Urbanos.

Para o Paraense, natural de Afuá, na região do marajó, “É um orgulho representar minha cidade e meu estado nessa premiação, pude falar lá um pouco sobre as belezas da minha cidade, a fotografia premiada demonstra o porquê de a cidade ser conhecida como “a Veneza marajoara”, já que as construções são feitas sobre palafitas", relatou o vencedor. Josivaldo é fotógrafo na cidade de Afuá.


Foto premiada. Rua do estádio.


O concurso é de nível nacional e premiou as três melhores fotografias em três categorias diferentes. Os vencedores foram Arlan Filho, do Mato Grosso na categoria Cenários Rurais, Fernanda Campos, de Pernambuco na categoria Atividades Agropecuárias e Josivaldo Ribeiro, do Pará, em Cenários Urbanos.

Foram inscritas 11.525 fotos, 2.086 recenseadores participaram do concurso, as fotos obtiveram um total de 18.902 votos. A foto de Josivaldo recebeu 525 votos. Além da premiação, foi lançado o livro Nas lentes do recenseador, que traz 76 fotografias selecionadas na etapa estadual do concurso.

Vencedores: Arlan Filho, de mato-grosso (esquerda), Fernanda Campos, de Pernambuco (centro) e Josivaldo Ribeiro, do Pará (direita).


O Prêmio Fotográfico Censo Agro 2017 foi lançado pelo IBGE em dezembro do ano passado, como forma de reconhecer os recenseadores e valorizar os “olhares” desses profissionais sobre os locais que percorreram durante a coleta de dados.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

TV CANADENSE VIRÁ AO MARAJÓ GRAVAR DOCUMENTÁRIO SOBRE AFUÁ


Vista aérea de Afuá. Foto: Denny Wesley.

Não é de hoje que a cidade de Afuá, localizada no norte da ilha de Marajó, no Estado do Pará, desperta curiosidade de pessoas do mundo inteiro em especial da mídia.

Jornais, revistas e TVs de vários países já vieram a Afuá para documentar as peculiaridades da cidade. Vários programas da TV Globo como Globo Repórter, Mais Você, Fantástico e Domingão do Faustão também​ já estiveram na cidade. Revistas e jornais da Itália, França e Alemanha também já falaram sobre a veneza marajoara.

Neste ano uma equipe de tv do Japão veio gravar matéria na cidade. Em 2014 uma rede de TV da China veio documentar o fenômeno lançante (maré alta), no mês de abril.

Maré Lançante em Afuá, abril de 2017. Foto: Jota Barbosa

A cidade possui certas características que a difere das demais, como não possuir carro nem moto ( é proibido por lei ), ser construída sobre palafitas e pelo bicitaxi, criação local, que é a junção de duas bicicletas.

Bicitaxi. Foto: rumo norte expedições.

Percebe-se também que a cidade está se tornando um grande polo turístico do Estado do Pará, com número crescente de turistas a cada ano, inclusive com a vinda de navios de cruzeiros internacionais.

Navio de cruzeiro alemão em Afuá, fevereiro de 2018. Foto: Jota Barbosa

Desta vez uma equipe da TV 5 do Canadá virá a cidade gravar para o programa "The Island Diaries", que em português quer dizer "o diário da ilha". O documentário também será exibido em diversas emissoras de TVs de vários países. Segundo a pesquisadora  da emissora canadense, Joanne Robertson, o programa visa mostrar os estilos de vida únicos que são vividos nas ilhas ao redor do mundo. "É uma série documental sobre a vida na ilha. Nós exploramos como as pessoas vivem em ilhas ao redor do mundo, por exemplo olhamos para o transporte, como as pessoas obtêm seu alimento, como chegam à escola, olhamos para a relação delas com a água, cultura e identidade", afirmou.

A equipe, que também irá para a cidade de Soure, também na ilha de marajó, já passou por diversas ilhas de vários países como Grécia, Cuba, Indonésia, Portugal, Estados Unidos, entre outras.

quinta-feira, 5 de julho de 2018

DIVULGADAS AS ATRAÇÕES DO FESTIVAL DO CAMARÃO 2018

Chegou o mês de julho e com isso também cresce a expectativa das pessoas para saber quais atrações musicais estarão no festival do camarão do município de Afuá-PA, que é a maior festa cultural do marajó e uma das maiores do estado do Pará. Neste ano a festa irá completar trinta e seis anos.

Logo oficial do festival do camarão.

Foi divulgado pela assessoria de comunicação da prefeitura as atrações deste ano. Vamos a lista.

Paulo Ricardo
Márcia Fellipe
Latino
Silvania e Silvania ( ex calcinha preta )
Cabaré do brega
Baladeros
Karol diva
MC loro
Perola negra
Banda sedução
Dani Li
Taty Taylor
Adail Jr.
Raul e os intocáveis
Pagode nosso jeito

Cartaz do festival desse ano:

Arte; Patrick Chagas.

Programação 


QUINTA-FEIRA – 26/07/2018
16:00 – XIII BICIATA
19:00 – SOM MECÂNICO
20:00 – BANDA SEDUÇÃO
22:00 – KAROL DIVA
00:00 – SILVÂNIA E PAULINHA
02:00 – BANDA PÉROLA NEGRA

SEXTA-FEIRA – 27/07/2018
19:00 – DANI LI
20:00 – KAROL DIVA
21:30 – PÉROLA NEGRA
23:00 – ABERTURA OFICIAL
23:30 – LATINO
01:30 – BALADEROS
03:30 – CABARÉ DO BREGA

SÁBADO – 28/07/2018
12:00 – SOM MECÂNICO
13:00 – PAGODE NOSSO JEITO
15:00 – BANDA SEDUÇÃO
17:00 – CONCURSO RAINHA DO FESTIVAL
18:00 – RAUL E OS INTOCÁVEIS
20:00 – DANI LI
22:00 – BALADEROS
00:00 – MÁRCIA FELLIPE
02:00 – CABARÉ DO BREGA
04:00 – TATY TAYLOR

DOMINGO – 29/07/2018
12:00 – SOM MECÂNICO
14:00 – PAGODE NOSSO JEITO
16:00 – CONCURSO MISTER CAMARÃO
18:00 – RAUL E OS INTOCÁVEIS
20:00 – MC LORO
22:00 – PAULO RICARDO
00:00 – TATY TAYLOR
02:00 – ADAIL JUNIOR

sexta-feira, 29 de junho de 2018

RAINHA DO FESTIVAL DO CAMARÃO, O DESTAQUE DA BELEZA AFUAENSE

"Eu sou uma mistura de sentimentos assim como deve ser toda brasileira. Sorridente, alegre, extrovertida, desconfiada e com o senso de humor variado. Eu gosto das pessoas que são empáticas, que sabem se colocar no lugar do outro porque isso faz com que a gente se torne carismático, e é uma característica que eu acredito carregar comigo porque me faz bem e faz com que o outro se sinta bem. Sou definitivamente sonhadora. Acredito que esse seja o grande desafio dessa vida, carregar de tudo um pouco e ir administrando isso no decorrer do tempo."

Assim se define a linda Elzivane Figueiredo, que do alto de seus 18 anos de idade e 1,56 m foi eleita na tarde do dia 29 de julho de 2017 a rainha do festival do camarão, o concurso de beleza mais importante de Afuá-PA. Ela concorreu com outras cinco candidatas.

Elzivane Figueiredo, rainha do festival do camarão 2017.
Foto: Paulo Brandão


Confira a entrevista exclusiva dada ao blog do jota barbosa e conheça um pouco mais da bela loira.

Quando começou o seu contato com o mundo dos concursos de beleza? e porque você quis ser a rainha do festival?


Primeiramente quero dizer que é um prazer esta participando dessa entrevista para o seu blog e tendo essa oportunidade de fazer com que os meus conterrâneos possam conhecer um pouco mais da minha história, sonhos e objetivos.
Bem, comecei meio que por acaso em concursos da escola quando ainda era criança, por incentivo de amigos e familiares. Surgiu a oportunidade de subir ao palco do concurso rainha do festival, que é o titulo de beleza mais almejado pelas mulheres desta terra.
Sempre foi um sonho carregar comigo a faixa de rainha desta festa maravilhosa que a cada ano que passa se torna ainda mais popular e conhecida. Na verdade, tinha vontade de entrar no concurso, mas não achava que conseguiria vencer [risos], mas acreditei em mim, no meu potencial, na minha determinação e desci do palco com a faixa e a alegria de representar o meu município e posso dizer que está sendo um reinado de muitas realizações e muito aprendizado para mim.

Como foi a sua preparação para o concurso? Precisou mudar a alimentação, deixando de lado alguma coisa que adora comer?


Eu posso dizer que tive uma preparação bastante intensa, com treinos pesados e tive a minha rotina de alimentação alterada por que decidi ir para o concurso quase em cima da hora e foi tudo meio corrido, mas o final de tudo foi maravilhoso, valeu a apena. Eu adoro massas, mas precisei ser determinada e deixar um pouco de lado [risos] para que eu pudesse ter um bom resultado. Posso dizer também que tive que me preparar não só fisicamente, mas também psicologicamente, porque eu tinha consciência que estaria me expondo, logo eu teria que está preparada para todos os tipos de opiniões.

Elzivane no dia do concurso.

Foto; Eder Furtado

Oque você gosta de fazer no seu tempo livre e o que teve de abdicar para o concurso?


Eu procuro aproveitar meu tempo com com minha família, estudando e participando de reuniões com amigos e praticando hábitos saudáveis. Gosto de praticar atividade física, porque acredito que é algo essencial pra saúde do nosso corpo e da mente e já aproveito pra deixar aqui meu incentivo para quem ainda não tem o hábito de praticar atividade física, para que possa fazer um esforço e dar o primeiro passo para ter uma vida saudável.
Para o concurso, eu precisei renunciar momentos de lazer com meus amigos e familiares por conta das atividades que tinha que me dedicar, mas eu acho essas renuncias algo normal pra quem está em busca de um sonho, é preciso perder pra ganhar mais lá na frente.

O que foi mais difícil para você : desfilar para o público e para os jurados ou a competição com as outras candidatas?


Desfilar para o publico e para os jurados é sempre muito difícil porque nós necessitamos da aceitação deles, mas o mais difícil mesmo foi vencer um desafio que eu tinha dentro de mim, eu era o meu maior obstáculo naquele momento, queria mostrar para mim mesma que eu podia, que era capaz. Assim, eu também poderia mostrar a outras futuras candidatas que elas também podem chegar lá. Acreditar que si mesma é sempre o primeiro passo.

Foto: Jota Barbosa


Qual foi a sua maior preocupação em relação ao concurso?


Sempre me preocupei em fazer tudo como mandava o meu produtor no momento do desfile. Depois, minha preocupação era está representando bem o meu município e principalmente a beleza da mulher marajoara, porque quando carregamos uma faixa a gente acaba se tornado referência para muitas meninas, assim como as outras que também já foram rainhas do festival se tornaram referência para mim um dia, é uma troca de experiência.


Como foi essa experiência que culminou com a sua vitória no concurso?


Maravilhosa! Acredito que tudo na nossa vida acontece com a permissão de Deus e sou eternamente grata e ele, a minha família e amigos por ter me dado a oportunidade de carregar por um ano a responsabilidade de representar esse mundo mágico que é o mundo da beleza.

Foto; Jota Barbosa


Voce pretende seguir carreira de modelo?


No momento, estou focada em outros objetivos como terminar meus estudos e ingressar numa faculdade, mas não impede que eu realize alguns trabalhos relacionados a essa área. Eu tenho algumas prioridades que poderei compartilhar futuramente com os meus conterrâneos e com aqueles que torcem por mim.

Qual é a mensagem que você gostaria de passar para as meninas  que sonham em ser a próxima rainha do festival?


Que primeiramente acreditem em si mesmas. O fato de já estarem no palco sendo observadas por um publico grande já é uma vitória. Vão acontecer algumas coisas que façam algumas pensarem em desistir, mas eu aconselho a serem persistentes e não desistirem desse sonho.
Aproveito para desejar a minha sucessora um reinado cheio de oportunidades e realizações. Eu estou sendo perfeitamente feliz no meu reinado e espero que a próxima também desfrute desse mesmo sentimento e que possa representar e carregar com orgulho a faixa de rainha do festival do camarão para engrandecer essa festa e o nosso município afuaense.

Veja mais algumas fotos do ensaio de Elzivane.

Foto: Paulo Brandão

Foto: Jota Barbosa

Foto; Jota Barbosa



terça-feira, 29 de maio de 2018

AFUÁ: DIARIO DE UM EMPINADOR DE PIPA

Esse texto conta um pouco da minha história como empinador de pipa. O texto é enorme, portanto deite-se ou sente-se e leia com calma, desculpa pelos erros ortográficos e de concordância também...Rsrsrs. As palavras em negrito são gírias usadas pelos empinadores e o significado delas estão no final do texto.

Pirralho empinando uma pipa. Não sei de quem é essa foto, só sei que peguei da internet.

Nos trapiches de Afuá, sempre lotados de crianças e adolescentes, mesmo debaixo de um sol escaldante, todos estão a procura dos melhores ventos para dar um laço.

Quando chegava o verão, por volta de maio, as pipas começavam a aparecer nos céus de Afuá, mas elas não eram tão valorizadas quanto as rabiolas de papel que se tivessem um desenho bonito e rabo de fita então... ai que a mulecada não desistia de correr atrás dela, ela podia até engatar numa árvore, mas a mulecada subia mesmo assim, disputando cada ponto de apoio na base do tapa! Tinha aquelas pezetas também, que eram as pipas feias que nem subiam, nem voavam. Mas era em julho que realmente o negócio ficava interessante! Aumentava o número de adversários e de pipas! É que já estava todo mundo de férias.

Rabiola de papel.

Pipa feita de sacola.

E quando ela caia no solo então, todo mundo ficava a espera querendo a rabiola de papel, quando alguém pegava dizia "deixa, deixa", porém se mais de um moleque pegava ela, aí começava uma briga eterna pra saber quem ficava com ela...Nesse caso duas coisas podiam acontecer, ou eles se dividiam, um ficava com a rabiola de papel e o outro ficava com o rabo de fita. Mas se ninguém entrasse em um consenso eles resolviam guisar a rabiola, ou seja quebrar, destruir para que ninguém fique com ela.

Rabiola com rabo de fita. Sonho de consumo de todos.

Sortudo mesmo é quem cortou e arou uma pipa ou rabiola, o azarado é quem tinha cerol manteiga.

Seu carretel de linha podia ser um simples pedaço de pau ou uma lata de óleo, de leite ninho ou então de Nescau. Mas também podia ser um vidro de desodorante tabu ou alma de flores... rsrsrsrs.

Linha enrolada na lata de nescau..kkkkk

Que saudade disso.

As vezes eu pedia da minha mãe. "Mãe posso empinar pipa no trapiche?" Ela dava logo um ralho daqueles. "Não, muleque, vai procurar o que fazer vai estudar, vai dormir." Então eu ia empinar do quintal​ de casa mesmo ou do castelo da caixa d'água.

Entre os empinadores haviam vários tipos:

Haviam aqueles que não tinham pena de dar um laço, pois se perdessem sua pipa era só comprar ou fazer outra.

Haviam os penosos que não queriam dar laço nem perder sua pipa, pois não sabiam fazer e nem tinham dinheiro para comprar outra, na visão daqueles que queriam dar laço só ficavam no trapiche para atrapalhar o espaço aéreo... rsrsrsrs... Geralmente se ouvia "sai daí penoso, sai daí penoso". Na maioria das vezes essa pipa que ele tinha, pegou em algum laço.

Havia aquele que era conhecido e temido por ter o melhor cerol de todos e que todo mundo queria descobrir o segredo do cerol dele.

Havia aquele que tinha o pior cerol de todos e que sempre perdia sua pipa em um laço e que sempre era motivo de piada entre os amigos.

Havia aquele que sempre ficava lá embaixo esperando um laço para correr atrás da pipa.

Havia aquele que sempre tinha as rabiolas mais bonitas e com rabo de fita e que não gostava de empinar pipa feita de sacola.

Havia aquele que nunca comprou um carretel de linha e que dependia de doação dos amigos ou então quando todo mundo ia embora, ele ia até o trapiche coletar os restos de linha...e ia emendando pedaço por pedaço até formar um carretel de linha, esse era eu.. rsrsrs...as vezes roubava linha de costura da mãe.
Quase ninguém se arriscava a dar laço com alguém que tinha nó na linha. Esse era o famoso laço porco...Kkkkk.

Havia aquele que tinha pena de linha. Ele sabia que sua pipa ia ser cortada no laço por isso não discaía tanta linha. Isso irritava o adversário, geralmente se ouvia "discai linha penoso".

Havia aqueles que não sabiam nem dar cabeça na pipa (kkkkkk), geralmente eram crianças.

Haviam alguns que não estavam nem aí, davam laço com a linha branca mesmo, ou seja linha não encerada.

Haviam aqueles que gostavam de impressionar, exageravam no tamanho da rabada. Às vezes tinha pipa com rabo de 5 ou 10 metros de comprimento.

E tinha o mais odiado de todos! O famoso puidor de linha. Essa pessoa na maioria das vezes já tinha perdido sua pipa em um laço, por isso ficava perto de alguém que tava empinando e, no discuido da pessoa, ele corroía a linha com o dente e ia embora. De repente, a linha do empinador se arrebentava "do nada".

Eu me matava correndo atrás de uma dessa..kkkkkk

Modinhas da época.


Era modinha pendurar a pipa, ou seja, puxar a linha para a pipa subir rapidamente por baixo da linha adversária. A galera também gostava de Aparar as pipas, ou seja usar a própria linha para segurar no ar um papagaio que vem chinando.
Tinha uns que diziam revira ele. Bom, revirar uma pipa era tarefa para os mais experientes, consistia em passar a linha sobre a do adversário até ficar quase fora do vento, e depois retornar, passando a linha também por baixo, é um tipo de laço mais eficiente A galera gostava também de enterrar a pipa, ou seja, dar cabeça na pipa, deixando-a numa rápida trajetória para baixo.

Cortou e arou.

Coisas que irritam um empinador de pipa:


O famoso bolô na linha. Realmente não tem coisa mais estressante do que enrolar a linha e se deparar com um bolô enorme, pois se você não conseguir desmanchar o nó, pode perder muitos metros de linha.

A chuva e o pouco vento;  Imagine a cena, você está empinando sua pipa normalmente, já descaíu toda sua linha, sua pipa está a mais de 50 metros de altura e de repente do nada começa a chover...se a sua rabiola for de papel então... ai o desespero é total, pois a chuva pode furar o papel da rabiola, sem falar que pode estragar o cerol da linha. A pessoa enrola a linha o mais rápido possível, corre o risco até de se cortar por causa do cerol.

Laço porco também deixava a galera furiosa, a ponto de brigar.

Como já falei, o pouco vento também é problema, pois você acorda em um belo dia ensolarado e vai para o trapiche empinar sua pipa...mas ela não sobe! É de cortar o coração...

Outra situação que nós odiávamos: pipa engatada. Pense no seguinte, a pessoa está prestes a dar o laço e de repente a pipa inclina para baixo e engata numa árvore, telhado ou num fio de alta tensão. Nesses dois primeiros ainda pode recuperar subindo na árvore ou no telhado, mas no fio de alta tensão... meu amigo.... é complicado!
As vezes a pipa engatava em um lugar tão alto que não dava pra subir..o jeito era jogar um bode. Assim dava pra pelo menos pegar a linha ou o rabo da pipa.
Quando engatava nos fios da rede elétrica sempre os moleques ficavam puxando a pipa e os adultos sempre ralhavam "seus bando de muleque pode parar de puxar, vai dar choque vocês vão morrer"....Dito e certo! As vezes dava choque e explodia os fios lá em cima e todo mundo saia correndo..Kkkkkkkkkkkk...(to rindo com respeito).

Outra situação que nós odiávamos: o matador de linha!
Ele simplesmente matava a linha. Quando a pipa era cortada, a linha caia sobre os telhados e demorava um pouco pra terminar de enrolar ela no carretel. Aí os espertinhos (eu era um..Kkkkk..) viam a linha passando pelo quintal e atorava com o dente ou tesoura. Dava pra roubar um pedação de linha. Eu adorava fazer isso, mas não gostava que fizessem o mesmo com a minha linha. (Kkkkkkkkkk porque sim).

Outra situação que eu odiava: alguém cortar a pipa e ela cair na água. Égua, não. Isso era horrível. Se ela caísse perto da margem e a maré tivesse grande os muleques iam pegar ela nadando. Mas se a maré tivesse seca, tinha que ir de casco.

Mas se a pipa ou rabiola inclinou para baixo de repente e engatou, provavelmente ela estava rabeando ou pensa. Neste caso a solução é aumentar o rabo, colocando mais sacola ou fita. Ou então colocar um penso em um ou nos dois lados da pipa. As vezes o problema é no gasgo, no peitoral ou na barriga, nestes casos é só fazer alguns ajustes. As vezes a pipa ficava no leso ou no treme...isso dava muita raiva, pois tinha que puxar a pipa de volta pra consertar ela e o bolo de linha só aumentava.

Era muito divertido no trapiche, muleques de outras ruas sempre vinham, dava até pra fazer novos amigos. Mas alguns eram muito barateiro, bronqueiro...

Quando alguém cortava uma pipa num laço, não tinha como não saber que isso aconteceu. Até quem estava dentro das casas sabia, pois a correria nas ruas de madeira era grande e tinha o já conhecido grito vááticee ou então váátice penosooo...esse é um momento de euforia pra quem esperou vários minutos o resultado de um laço.

Vááticee. A pipa vai chinando. Foi cortada.

Quando uma pipa era cortada...As vezes nem tinha tanta gente na rua, mas bastava alguém gritar vááticee, que saía muleques de tudo quanto é buraco, numa carreira desesperada atrás da pipa. Crianças desciam de árvores, saiam de dentro das casas, saiam debaixo da rua, desciam da rede elétrica (kkkkk...não pera)....sandálias havaianas não aguentavam a velocidade e arrebentavam pelo caminho.

Quando a pipa caía no quintal de uma casa era complicado! Pois o filho do próprio dono da casa podia pegar a pipa pra ele e também porque os muleques não podiam invadir o quintal alheio e não sabiam se tinha ou não cachorro. Mas sempre tinha aqueles corajosos que chegavam pulando a cerca e pegavam a pipa, mas sempre levavam um ralho do dono da casa.

Pra fazer cerol era problema pois se era pra fazer na própria casa tinha que ser escondido da mãe. Mas a melhor opção era fazer cerol em grupo na rua. Um dava jeito no vidro, outro trazia algo para pilar o vidro, outros ficavam com a tarefa mais difícil, roubar o caneco de alumínio da mãe...sem esse bendito caneco não tinha cerol. Cerol é algo muito perigoso, linha encerada pode matar, mas quando se é criança, não damos muita importância pra esse perigo... Infelizmente. Para fazer cerol, o ideal era misturar o vidro pilado com cola branca. Mas se não tinha dinheiro, o jeito era fazer cerol com mingau de farinha mesmo...kkkkkk. Dava pra fazer cerol com qualquer vidro, mas com lâmpadas florescentes eram melhores, pois fazia um cerol mais fino, deixava o cerol só do trisca.

Na maioria das vezes a galera encerava a linha na rua mesmo, amarrava a linha entre dois postes de luz e pronto. A parte chata eram as bikes que passavam por cima da linha e tirava todo o cerol. Isso dava raiva.

Aí eu estava numa boa e chegava a hora chata de ter que ir estudar...Sim, eu achava chato estudar, preferia passar o dia inteiro empinando pipa... Rsrsrs.

As vezes alguns iam para a rua as oito ou nove horas da manhã e ficavam perambulando por vários trapiches - a gente nem ligava para o sol escaldante. Aí dá onze horas, meio-dia...e minha mãe olha da porta da casa me procurando para almoçar..."mas cadê esse menino?"...

Até que ela consegue avistar a criatura lá na ponta do trapiche ou na beira da rua. A cor já não é a mesma, parece um pedacinho de carvão de tanto pegar sol. A mãe solta aquele berro "menino vem timbora almoçar, sai desse sol, tu não tem fome não?". Eu sempre dizia "já vou mãe". Ela vai para dentro da casa e depois de alguns minutos volta até a porta mais brava ainda, "menino vem logo comer, sai desse sol, vou já chamar o teu pai!".

Opa! Aí eu já começava a ficar preocupado, pois se ela chamasse o meu pai ia ser uma surra na certa!
Eu começo enrolar a linha para ir embora, mas meu amigo diz "dá o último laço"...então eu resolvo ficar mais um pouquinho, mas eis que aparece novamente a minha mãe na porta...xíii...

Não sei quem é esse piqueno, só sei que peguei da internet a foto.

Não tem situação mais vergonhosa do que a mãe ir buscar a gente no trapiche...e ela sempre vinha com uma sandália ou uma ripa na mão! Eu não sabia se dava a pipa para o meu amigo e corria ou ficava parado enrolando a linha...Dou a pipa para o amigo e minha mãe diz "bora muleque passa pra casa". Eu corro, mas ouço atrás de mim um barulho "pá" e sinto as minhas costas arder...foi uma sandalhada bem dada!



Ia pra casa almoçar com muita pressa e logo em seguida já queria ir de novo pra rua mas minha mãe me parava no corredor "bora moleque pode voltar, tu não vai mais pra rua". Eu ficava com muita raiva, mas obedecia. Eu ia para o pátio da casa observar, meus amigos já estavam no trapiche, debaixo de um sol de 1 da tarde. Minha mãe ia novamente me dar mais um aviso. "Tu acabou de comer, vai dormir, vai descansar o corpo".
Eu odiava dormir de dia. Eu deixava ela pegar no sono e fugia..Kkkkkkkkkkkk..

A tarde tudo se repetia, menos a parte em que minha mãe ia me buscar no trapiche. Assim que começava a anoitecer todo mundo ia embora pra sua casa. No dia seguinte começava tudo de novo, eu pego minha pipa e vou para o trapiche...

            Fim.

Mini dicionário com gírias e expressões usadas pelos empinadores de pipas de afuá.

LAÇO: momento em que as linhas adversárias se tocam no ar, existem muitas variedades.

PEZETA; pipa feia, que nem voa, nem sobe.

GUIZAR A PIPA; quebrar a pipa.

CORTOU E AROU; cortar a pipa e "segurar" ela com a linha.

CEROL MANTEIGA; cerol ruim, que nao corta nenhuma pipa.

RALHO; bronca.

CEROL DO TRISCA; cerol muito bom, bastava encostar na linha que já cortava a pipa adversária.

PENOSO;  adversário que tem pena de descair a linha ou que não gosta de dar laço, causa frequente de derrotas nos laços.

LAÇO PORCO; laço quando as pipas estão em baixa altura ou quando a pipa pega pela rabada da pipa do adversário.

DAR CABEÇA: manobrar a pipa para os lados e/ou para baixo;

LINHA BRANCA: linha não encerada.

RABADA; rabo da pipa.

PUIDOR DE LINHA; aquele que corrói com o dente a linha de alguém, para quando ele estiver empinando, a linha se arrebente no ar.

PENDURAR: puxar a linha para o papagaio subir rapidamente por baixo da linha adversária.

APARAR: usar a própria linha para segurar no ar um papagaio que vem chinando.

CHINAR; é o que faz um papagaio cortado, “vai embora para a China”.

REVIRAR; passar a linha sobre a do adversário até ficar quase fora do vento, e depois retornar, passando a linha também por baixo, tipo de laço mais eficiente.

ENTERRAR; dar cabeças na pipa deixando-a numa rápida trajetória para baixo.

BOLÔ NA LINHA; nó na linha.

DESCAIR: soltar a linha, principalmente durante o laço para que a pipa voe mais alto.

CEROL; goma feita pela mistura de cola branca ou mingau de farinha e vidro moido.

BODE: pedra ou peso amarrado numa linha, com o objetivo de baixar ou matar a linha de alguém. Também serve para puxar pipas engatadas nas árvores.

MATAR LINHA: reter ou subtrair a linha de um pipa chinada, que cai sobre o nosso quintal.

CASCO; canoa movida a remo.

RABEAR; pipa ficar girando no ar fazendo movimentos circulares.

PENSA; pipa que só vai para um lado.

PENSO; pedaço de fita ou sacola amarrado em um ou nos dois lados da pipa, para que não fique indo para um lado só.

GASGO: área da linha próxima da pipa.

PEITORAL: fio amarrado nos extremos verticais das tala das pipas, onde se amarra a linha.

BARRIGA: curvatura realizada manualmente na pipa (na barriga), para dar-lhe maior estabilidade.

LESO: estado de pouca força e peso em que o papagaio se encontra quando a linha é amarrada muito acima no peitoral.

TREME: estado oposto ao leso, em que a linha é amarrada mais ao meio do peitoral, causando muita tensão na linha.

BOLO: (de linha), onde fica armazenada a linha para empinar; a forma esférica favorece descair durante os laços.

BARATEIRO/BRONQUEIRO; pessoa que gosta de causar confusão.

VÁTICE/VÁTICE PENOSO; grito que se dá quando uma pipa é cortada, quando ela vai chinando.

ENCERAR: (a linha): adicionar cerol.

RIPA; pedaço de pau fino.

SANDALHADA; pancada com uma sandália.


segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

TV DO JAPÃO VIRÁ AO MARAJÓ GRAVAR MATÉRIA SOBRE AFUÁ


vista aérea de Afuá. Foto; Denny Wesley

Não é de hoje que a cidade de Afuá, localizada no norte da ilha de Marajó, no Estado do Pará, desperta curiosidade de pessoas do mundo inteiro em especial da mídia.

Jornais, revistas e TVs do mundo inteiro já vieram ao Afuá para documentar as peculiaridades da cidade. Vários programas da TV Globo como Globo Repórter, Mais Você, Fantástico e Domingão do Faustão já estiveram na cidade. Revistas e jornais da Itália, França e Alemanha também já estiveram na veneza marajoara.

Em 2014 uma rede de TV da China veio documentar o fenômeno do lançante (maré alta), no mês de abril.

Maré lançante em Afuá, abril de 2017. Foto; Jota Barbosa

A cidade possui certas características que a difere das demais, como não possuir carro nem moto ( é proibido por lei ), ser construída sobre palafitas e pelo bicitaxi, criação local, que é a junção de duas bicicletas.

Bicitaxi. Foto; rumo norte expedições

Percebe-se também que a cidade está se tornando um grande polo turístico do Estado do Pará, com número crescente de turistas a cada ano, inclusive com a vinda de navios de cruzeiros internacionais.

cruzeiro alemão em Afuá, fevereiro de 2018. Foto; Jota Barbosa

Desta vez uma equipe da fuji tv, uma das maiores rede de TV do Japão, deverá chegar ao Afuá no dia 27 de fevereiro e ficarão na cidade até o dia 08 de março. A jornalista da emissora japonesa, Shoko Mori, já fez duas viagens à cidade para fazer um levantamento preliminar sobre o que será mostrado nas filmagens. Segundo a produtora da TV, hiroko ushida, essa é uma série de reportagem que visa mostrar a cultura de pequenas cidades do mundo onde tem estilo de vida e conceito de felicidades peculiares e apresenta algumas pessoas famosas e queridas da cidade que ajuda os moradores. A equipe já passou por cidades da Colômbia, Indonésia, Austrália, entre outras.